Era uma vez um cão. E era uma vez um gato. Ambos viviam na mesma casa.
O cão costumava correr atrás do gato, e o gato costumava subir ao muro alto do jardim para fugir do cão. Era uma canseira.
O cão andava sempre agitado, quando não era atrás do gato, era a fazer buracos no jardim, ou a correr atrás da sua própria cauda até cair para o lado. Depois descansava um pouco e recomeçava tudo de novo.
Certo dia o gato, no seu refúgio no alto do muro, estava a observar o cão naquela tarefa intrigante de perseguir a própria cauda, quando finalmente a curiosidade venceu o medo, porque os gatos são mais curiosos do que medrosos, e resolveu perguntar:
- Psssst... Cão... ó Cão. Cãao!!!... Hei!
- Que é que foi, ó Gato? Não vês que estou ocupado?!
- É só uma pergunta!!!
- Tu queres perguntar-me uma coisa?!? Ora essa...!
- Desculpa lá, estou para aqui a pensar... o que é que tu estás a fazer?!?
- EU? Então não vês?! (Este gato é mesmo estúpido!) Vou explicar: Vês isto aqui atrás? Isto que abana?! É a minha cauda e assim que vou atrás dela, foge e não consigo apanhá-la... por mais voltas que dê, quando estou mesmo quase a tocar-lhe, foge logo!... Mas hei-de conseguir um dia.
- E para que é que a queres apanhar?
- Para quê?! Porque nunca a apanhei e quando conseguir vou ficar muito feliz! Ora para quê!
- E o que é que fazes com ela depois?
- Então, depois... depois apanho-a outra vez, e outra, e outra...
- É por isso que corres atrás de mim, para apanhar a minha longa cauda de gato?
- Claro! Quando trincar a tua rica e longa caudinha e a fizer curta como a minha, vou ficar mesmo muito contente, vais ver!
- Oh Cão, desculpa lá, mas tu és um palerma!
- Eu?! Palerma?!? Que atrevimento! Se eu conseguisse subir o muro, arrancava-te já a cauda para veres como é! Palerma...!
- É o que tu és. Isso não faz sentido nenhum, e se não consegues perceber porquê, eu explico.
- Ai é? Então explica lá, a ver se me convences.
- Bem... se tu andares em linha recta, assim como quando corres ou fazes buracos, onde está a tua cauda? Vai atrás de ti, não é?
- Sim, claro...
- Então quer dizer que se ela vai atrás de ti, é porque já te pertence. E se te pertence, é tua, não precisas de a apanhar, ela vai sempre atrás de ti para onde fores. Não és mais feliz assim?
- Bem, ó Gato... assim... em linha recta.... hum, lá isso parece que sim... eu ando... olha! Vem cá atrás!... acho que tenho de te dar razão... mas espera lá, e a tua?
- A minha? Se eu andar para a frente, ela vai comigo. Mas se quiseres, também pode ir contigo, a escolha é tua.
- Minha?! Como é que a podes deixar ir comigo?
- Podes escolher: se me continuares a perseguir, a minha cauda vai estar sempre à tua frente, mas se me deixares caminhar contigo, ela vai connosco.
- Olha, Gato, pensando bem, acho que tens razão... surpreendeste-me! Porque é que não desces daí e vamos passear os dois?
- Tens a certeza que não me vais morder?!
- Sim, claro que tenho. Assim, em vez de perseguir uma cauda, ficamos com duas (e a tua ainda é mais longa!) que vêm atrás de nós. Para dizer a verdade, já começava a ficar farto de andar às voltas e encontrar sempre o meu próprio rabo...
A partir desse dia, Gato e Cão caminharam juntos até ao pôr-do-sol... e para além disso.
Tal como a cauda do cão, assim é a felicidade: já a temos, só nos falta a atitude de sermos felizes.